Alberto Caeiro
“Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é.
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem por que ama, nem o que é amar...”
Caeiro apresenta-se como um "simples guardador de rebanhos", a quem só importa absorver de forma natural e objectiva a realidade, "pensar incomoda como andar à chuva". Deseja integrar-se na natureza através da visão e da audição. E por isso pensa, ouvindo e vendo.
Assume-se como um verdadeiro sensacionalista, reduzindo o sentido das coisas à percepção da cor, da forma e da existência. O mundo é visto sem necessidade de explicações, e por isso, o facto de existir já é maravilhoso. Não existe princípio nem fim. Caeiro aproveita cada momento da vida e cada sensação na originalidade e na simplicidade que existem.
Perante esta breve apresentação, "o guardador de rebanhos" é para mim o "poeta do olhar". Como tal, a verdadeira essência das coisas encerra-se nelas mesmas. A simplicidade da uma flor, a grandiosidade de uma àrvore, a suavidade dos prados, todas a sensações são entendidas conforme a nossa visão e a nossa audição. O pensamento do homem é apagado, e portanto, a percepção do mundo é retida através do primeiro olhar.
O "argonauta das sensações verdadeiras" é para mim simplicidade e inocência. A sua personalidade é vaga e extremamente despreocupada com a sequência natural da vida.
Ricardo Reis
Atrás não torna, nem, como Orfeu, volve
Sua face, Saturno.
Sua severa fronte reconhece
Só o lugar do futuro.
Não temos mais decerto que o instante
Em que o pensamos certo.
Não o pensemos, pois, mas o façamos
Certo sem pensamento.
Sua face, Saturno.
Sua severa fronte reconhece
Só o lugar do futuro.
Não temos mais decerto que o instante
Em que o pensamos certo.
Não o pensemos, pois, mas o façamos
Certo sem pensamento.
Educado num colégio de Jesuítas, Ricardo Reis, é um poeta clássico, de serenidade epicurista, que aceita com calma e lucidez, a relatividade e a fugacidade de todas as coisas. A sua filosofia é baseada num epicurismo triste, uma vez que defende o prazer do momento. "Carp Diem" é o caminho da felicidade, no entanto, para alcançar a felicidade não devemos ceder aos impulsos dos instintos (estoicismo).
Ricardo Reis tem noção da brevidade, da fugacidade e da transitoriedade da vida, pois sabe que o tempo passa e tudo é efémero, sendo o destino inelutável. Considera que a verdadeira sabedoria e viver de forma equilibrada e serena, "sem desassossegos grandes".
Para definir este Heterónimo pensei em adjectivos como. clássico, fugaz, efêmero e quietude.
Álvaro de Campos
Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir.
Sentir tudo de todas as maneiras.
Sentir tudo excessivamente,
Porque todas as coisas são, em verdade, excessivas
E toda a realidade é um excesso, uma violência,
Uma alucinação extraordinariamente nítida
Que vivemos todos em comum com a fúria das almas,
O centro para onde tendem as estranhas forças centrífugas
Que são as psiques humanas no seu acordo de sentidos.
Sentir tudo de todas as maneiras.
Sentir tudo excessivamente,
Porque todas as coisas são, em verdade, excessivas
E toda a realidade é um excesso, uma violência,
Uma alucinação extraordinariamente nítida
Que vivemos todos em comum com a fúria das almas,
O centro para onde tendem as estranhas forças centrífugas
Que são as psiques humanas no seu acordo de sentidos.
Campos surge em Fernando Pessoa como "um impulso de escrever". Ao contrário dos dois heterónimos anteriores, este autor é o "filho indisciplinado da sensação e para ele, a sensação é tudo", apreendendo de Caeiro a urgência de sentir, não lhe bastanto sentir as coisas como elas são. Álvaro de Campos, procura a totalização das sensações e das percepções, desejando sentir tudo e de todas as maneiras.
Fernando Pessoa caracteriza-o como vanguardista e cosmopolita que exalta em tom futurista, a civilização moderna e os valores do progresso. Torna-se completamente confuso, a ponto de tentar sentir "tudo e de todas as maneiras", o que o transforma a sua escrita violenta.
Esta contextualização leva-me a classificar Álvaro de Campos como um poeta modernista/futurista, que encerra em si mesmo três fases especiais. A primeira, a fase do decadentismo em que há necessidade de sentir e experimentar sensações; a segunda, a fase sensacionalista, que compreende a celebração do triunfo da máquina e da energia mecânica.E por último a fase do pessimismo, onde Álvaro de Campos percebe que realmente, não conseguiu sentir nada, pois foi incapaz de tantas realizações.
Este heterónimo é para mim confusão, ruído, revolta e frustação.